terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O ANJO CAÍDO (1ªTemp.) Cap. 4



                      4. Conhecendo os tios arcanjos.
Pouco a pouco fui recobrando minha consciência: primeiro veio-me sons de vozes desconhecidas misturadas com a de Miguel; depois meus olhos vislumbravam vultos negros.
Se antes minha cabeça doía, agora, podia senti-la explodir. Também não era para menos, já que eu fora atirado pro outro lado do galpão, fazendo com que batesse a cabeça na dura parede de concreto. Passo a mão sob meu crânio para ver se faltava alguma coisa, mas, felizmente, tudo estava lá.
Procuro por minha concha companheira. Será que ela se espatifara com o brusco voo? Procuro por ela no bolso falso de minha jaqueta jeans azul. Apalpo-o volume que o objeto criava. Ufa!Tudo indicava que ela estava inteira. Mas para ter total certeza a retiro do bolso e fico a admirá-la: sua beleza continuava inalterável, sã e salva, sem nenhum mínimo risco. Solto um suspiro aliviado.
Não sabia por que dava tanta importância aquilo. Tá. Tudo bem que ela deveria valer muito dinheiro em qualquer loja de antiguidade ou até mesmo num museu, porém, o resguardo que dava a ela era algo muito exagerado. Olhe que até eu admito. Só que a culpa não era minha. Havia algo nela que me impelia a cuidar dela como se fosse uma filha para mim.
Refletia sobre isso, quando atesto que não estava só naquele grande salão. Havia cinco homens ladeando Miguel. Que falavam aos berros, com aquelas vozes que pareciam trovões, encrenqueiros quais disputavam seu espaço para riscar no céu de chuva. Pude ouvir um deles dizer:
--Miguel, tens certeza que vais contar a verdade ao garoto? Isso pode fazê-lo odiá-lo, bens sabes...
Silêncio, fora a resposta de Miguel. Um silêncio de dúvida, aflitivo.
--Tenho de contar a verdade Rafael... Se não contar, me sentirei muito culpado... Além, de que ele é meu filho e por isso ele deve saber a verdade...
--Até onde você contara a verdade?—interroga o cara de cabelos alaranjados como uma cenoura.
--Contei somente que eu era seu pai, que sou um arcanjo e que meu nome era Miguel...
--A decisão é sua, mas você sabe que no final teremos que aniquilá-lo... —disse o mesmo anjo de cabelos alaranjados. A pela voz dele percebi que era antipático. Devia fazer o tipo rabugento que detesta adolescentes. Miguel ficara calado. A voz lhe sumira de repente.
Ouvira o que eu ouvira?Miguel iria me aniquilar, me matar? O que eu fiz?A resposta logo me veio alta e em bom tom:
--Tens de matá-lo, ele roubara algo dos céus Miguel, que se cair em mãos erradas, poderás destruir toda a criação de nosso Pai— falou um homem de cabelos negríssimos como jabuticaba. --Se você não fizer, infelizmente, teremos de agir...
Miguel silêncio puro.
--Viemos aqui justamente por causa disso... Viemos apenas precavê-lo—anunciara o cara atarracado de cabelos marrom claro. A sua voz era a mais nervosa de todas.
Miguel novamente emudecera. Não conseguia exprimir nenhum som. O grupo de anjos (já suspeitava que fossem) olhava-o expectantes.
Em resposta Miguel acede com a cabeça. Parecia não ter forças para contrapô-los. Obviamente tinha-os como certos e com isso calara-se. Não podia opor-se.
Mas eu não podia deixar barato. Tinha de agir. Lutar pela minha sobrevivência ou pelos menos, descobrir, antes de morrer, o motivo de eles quererem meu óbito. Levanto-me decidido, empunhando a concha na mão direita e vou à direção do grupo angelical. Meu coração acelerava, meus pulmões trabalhavam loucamente para manter meu corpo bem oxigenado. Começo a suar.
O primeiro a perceber minha aproximação fora o de cabelos alaranjados:
--Miguel, você não dissera que ele dormia?—disse olhando e apontando em minha direção. O que fez Miguel olhar pro lugar indicado.
O som de meus passos reverberava naquele chão negro e ensebado. Já ia à metade do caminho. Faltavam poucos passos para me confrontar com aqueles que me queriam por morto, quando uma ideia lampeja em meu cérebro. O tempo todo eles afirmavam que eu estava com algo que pertenciam ao céu. Como não pensara isso antes! Era aquela concha que eles queriam... Podia fazer uma troca. A concha pela minha vida.
Seria um trato mais do que justo. De súbito, estaco. Estava no meio do caminho. A luz do dia começava a penetrar pelas janelas empoeiradas. E um jato luminoso proveniente duma telha faltante, banhava-me dando-me um ar quase angelical. E proponho o seguinte tratado:
--EI, VOCÊS AÍ, ME OUÇAM: QUERO PROPOR A VOCÊS UM ACORDO— silêncio da outra parte; olhavam todos na minha direção. O plano começava a funcionar. —EU LHES DEVOLVO A CONCHA E VOCÊS ME DEIXAM VIVO. —digo em voz alta e nítida, apesar de que, estava tremendo feito um graveto ao vento, de medo.
Silêncio de ambas as partes. Eu os observava e eles idem. Parecia uma daquelas cenas de filme de faroeste, onde dois pistoleiros aguardam mínima reação do adversário para disparar. Estavam me estudando, com aqueles olhos que variavam do azul ao verde.
Acho que tinha que ser mais radical.
-- VOCÊS NÃO OUVIRAM O QUE EU DISSE?—pergunto empunhando a concha com as duas mãos. —TROCO ESTA CONCHA PELA MINHA VIDA... SE VOCÊS NÃO A QUISEREM POSSO DEIXÁ-LA CAIR E SE ESPATIFAR NO CHÃO SEM NENHUM PROBLEMA...
Ao dizer isso o grupo verte o olha para mim. Viam-me como cães de guarda quando encontram a sua frente um gato. Estavam pronto pra caírem em cima de mim com certeza.
Abaixo a concha e a devolvo ao meu bolso falso.

Engulo seco. Estava ferrado.

                           ***

--Enfim, o encontramos!—anuncia-me Rubie como se tivesse acabado de topar com as minas do rei Salomão.
O sol já aparecia naquele céu azul anil. Ardia fortemente, sinal esse que indicava chuva, o tal mormaço usado pelos humanos para designar tal fenômeno. Deixando o bosque para trás, tínhamos a nossa frente um velho prédio abandonado, com duas torres de tijolos avermelhados que pareciam duas enormes chaminés desativadas, ladeando-o. Aquele era o lugar, não tinha a menor dúvida.
--Enfim, chegamos. O que faremos agora?—pergunto a Rubie que assumira o posto de líder até então.
--Temos que esperar... Sinto a presença de outros penosos por perto. Devem ter se reunido—disse ela. Como assim esperar?Que se danassem os arcanjos! Eu queria o quanto antes aquele anjo em minhas mãos e não podia perder tal oportunidade. —Melhor nos escondermos atrás daquele arbusto ali, perto daquele gradil... Não podemos nos aproximar muito, senão eles irão detectar a nossa presença...
Descemos aquele morro íngreme com muita cautela para não levarmos um tombo. Apesar de que era meio dificultoso descer aquilo com salto alto agulha. Porém, acabamos por chegar inteiras naquela moita. Tudo bem que era um arbusto grande e enorme, que cobria quase toda a extensão de nossos corpos, mas aquilo me fazia se sentir uma perfeita otária.
Agora tínhamos que esperar. O que eu detestava fazer.

                                   ***

Tudo fora muito rápido. Mal tive o tempo de dar-lhes as costas e começar a correr, pois eles já estavam a minha frente. Fico imaginando como eles conseguem fazer aquilo. Aparecer e desaparecer quando quiserem. Num estalar de dedos sumiam e reapareciam. Agora estava ali me bloqueando a porta.  
--EI, CARAS EU ESTAVA BRINCANDO SABE... EU NÃO FARIA ISSO DE VERDADE, ERA SÓ ZOAÇÃO... —explico gritando. O que não adiantara em nada, pois assim que fecho minha boca, eles voam em cima de mim. Quando digo que eles voaram sobre mim não é nenhuma figura de linguagem não, hein. Realmente eles voaram em cima de mim como um ataque insano de pombos assassinos. Igual naquele filme de Alfred Hitchcock em que uma cidade inteira é atacada por pássaros. No meu caso era de anjos.
Agacho-me tentando me escudar com minhas mãos e braços. Não havia mais chances de luta ou fuga. A única chance era me entregar a tal destino. Pensava isso quando Miguel arcanjo e meu pai se interpõem entre mim e os anjos enfurecidos. Aquilo fora algo muito magnífico.
Miguel de repente, distendera as suas assas de albatroz gigante. Cada pena que formava aquele par e assas estava retesado, pronto para atacar. Aquelas penas eram douradas e reluzentes cujas ficavam autenticamente angelicais com aquela luz diurna a penetrar pelo caibro semi destelhado do lugar.
Naquele momento, não sei o porquê soube que, deveras, Miguel era o meu pai. Acho que percebera isso quando encarei aqueles dois olhos azulíssimos e tão profundos quanto o oceano. Senti que deles emanavam, uma espécie de sentimento palpável: o amor.
Os arcanjos já nos cercavam. Formavam um circulo intransponível.
--OUSAS DEFRONTAR-TE CONTRA VOSSOS IRMÃOS, MIGUEL?—grita o anjo de cabelos laranja. A voz dele parecia um chicote estalando no ar. Que cara mais chato!Parecia ser o líder do grupo.
--NÃO OUSO NADA IRMÃO. DEIXAIS QUE EU CUIDE DE YZAEL, NÃO SE PREOCUPAIS COM NADA IRMÃO— responde o interlocutor angelical. As assas dele se tornava cada vez, mais retesadas, apenas esperando à hora do ataque.
No entanto, o que ele quis dizer com: DEIXAIS QUE EU CUIDE DE YZAEL?Será que meu próprio pai me mataria?Não isso não poderia ser.
--TERÁS SOMENTE TRÊS DIAS PARA MATÁ-LO. PASSADO O PRAZO E VOCÊ AINDA NÃO O TIVERA ANIQUILADO, NÓS VOSSOS IRMÃOS, RETORNAREMOS PARA EXECUTÁ-LO.
Fora o que o arcanjo de cabelo de polpa de laranja dissera. Ao que Miguel assentira em concordância sem nenhuma resistência ou reclamação. E como da outra vez, um enorme clarão invade o lugar cegando-me durante alguns instantes. Passo as mãos nos olhos pra amenizar os efeitos daquela mega exposição. Aquilo era como se você estivesse na frente de um obturador duma máquina antiga e gigantesca que ao clicar lança um enorme flash em sua direção. Todavia, aquela luz deixava você plenamente zonzo o que faz você cambalear e quase cair no chão, se seu pai arcanjo não o aparasse em seus braços.
--Você vai me matar mesmo?—pergunto recuperado a ele. Minha resposta viera logo depois duns instantes de silêncio incomodante e enervante. Parecera-me que avalia todas as possibilidades daquela pergunta, era como se buscasse a resposta pra ela.
--Infelizmente, sim. Tenho três dias para matá-lo. —responde-me ele friamente.

                                 ***
--Você sentira toda essa energia, Rubie?Será que eles já foram embora?Será que eles levaram o anjo?—pergunto. Quando aquele clarão evacuara pelo telhado antigo da fábrica os pelos de meu corpo arrepiaram-se dos pés a cabeça.
-- Não. Há ainda um anjo e um arcanjo lá dentro. Posso sentir. Acho que chegou o momento de tentarmos nos aproximarmos— diz-me ela levantando-se agilmente e grudando no gradil enferrujado como um lagarto. —Você vai ficar aí feito uma boba me olhando?
Subo, seguindo minha parceira. Tinha de pegar o anjo.

CONTINUA...


2 comentários:

  1. Um anjo matar o próprio filho. A história está ficando tensa, muito bom Rafael! :D

    planetavx.blogspot.com

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  2. Obrigado Michael é sempre um przer em tê-lo ,aqui, no blog!


    Abraços.

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